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Linguagista

Léxico: «móbula»

Cabe em todos

 

      «A fotografia “Killing Angels” (“Matando Anjos”), captada a este de Java, onde se encontra o segundo maior porto de pesca da Indonésia, retrata um aldeão a processar uma móbula, ou jamanta, com uma catana, a fim de lhe extrair as guelras, que são depois exportadas para a China e usadas no fabrico de medicamentos tradicionais» («João Rodrigues distinguido em concurso mundial de fotografia subaquática», Rádio Renascença, 26.02.2019, 22h18).

      Cabe nuns, não cabe noutros. No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: ✘. No VOLP da Academia Brasileira de Letras: ✔.

 

[Texto 10 898]

Léxico: «helenístico»

Podia dizer-se mais

 

      Helenístico, para o dicionário da Porto Editora, é o adjectivo «1. relativo aos Helenos ou à Grécia; 2. referente à cultura grega; 3. HISTÓRIA referente ao período entre a conquista do Oriente por Alexandre Magno e a conquista da Grécia pelos romanos». (Helenos com maiúscula e Romanos com minúscula... enfim.) Foi o historiador alemão Gustav Droysen (1808-1884) o criador do termo «helenismo» para a síntese greco-oriental pós-alexandrina, informação que os dicionários deviam difundir.

 

[Texto 10 897]

Léxico: «(proto)tiranossauro»

Sabe-se agora que não

 

      «Um fóssil parcial de um prototiranossauro, encontrado no estado do Utah, nos Estados Unidos, revela que há cerca de 96 milhões de anos, já no início do Cretáceo, este predador era apenas um pequeno dinossauro a lutar pela sobrevivência entre os gigantes da sua época. Os cientistas batizaram-no de Morus Intrepidus, que se pode traduzir como “O Mais Corajoso”» («Descoberto tiranoussauro [sic] com menos de 90 quilos», Pedro Sousa Tavares, Diário de Notícias, 22.02.2019, 12h41).

      Ora, com cerca de 85 kg, este prototiranossauro (palavra que se usa, mas não se admite nos dicionários) já não encaixa na definição de tiranossauro dos nossos dicionários. Vão pensando noutra melhor.

 

[Texto 10 896]

Léxico: «cirúrgico»

Já se passaram anos

 

      Não começou a usar-se nessa altura, mas no início dos conflitos na Síria, o regime de Bashar al-Assad temia estar em preparação um ataque cirúrgico contra o país, e a expressão repetia-se e repetia-se (tradução do inglês surgical strike). Agora, menos letal (pelo menos para a generalidade da população), temos aí as greves cirúrgicas dos enfermeiros — e os lexicógrafos continuam impassíveis. «O Governo acusava os enfermeiros de violação dos serviços mínimos decretados para a “greve cirúrgica” em quatro centros hospitalares, razão pela qual avançou para a requisição civil no início de fevereiro» («Greve dos enfermeiros. ​Supremo dá razão ao Governo na requisição civil», Rádio Renascença, 26.02.2019, 16h36). Também temos alterações cirúrgicas na lei: «O Governo está disponível para fazer “alterações cirúrgicas” à legislação sobre violência doméstica, anunciou a ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, apesar de entender que a atual legislação é “forte” e está em linha com as orientações internacionais» («Governo disposto a fazer “alterações cirúrgicas” à lei da violência doméstica», Rádio Renascença, 27.02.2019, 13h30). É óbvio que em cirúrgico não se pode continuar a dizer somente «de cirurgia; relativo a cirurgia». Ninguém dá por nada...

 

[Texto 10 895]

Léxico: «chave»

Ora, isso é estranho

 

      «É claro que, se jogarmos uma vez por semana, as probabilidades de acertarmos na chave do Euromilhões é mais sedutora: em cada 2 000 000 de anos passa a ter-se uma hipótese de ganhar» (Queremos Melhores Pais!, Eduardo Sá. Alfragide: Lua de Papel, 2013, p. 133).

      Não vejo esta acepção de chave — tão presente no dia-a-dia — nos nossos dicionários. Será sinónimo de «resultado», por exemplo.

 

[Texto 10 894]

Mais «fatos» ortográficos

A língua vai nua

 

      Doravante, é possível apresentar queixas contra polícias no sítio do IGAI. Maravilha. Vejamos o que se diz ali: «Deve preencher (tendo em atenção os campos de preenchimento obrigatório assinalados com asterisco) o formulário da sua queixa/denúncia de forma completa e fundamentada indicando, sempre que possível, informação detalhada sobre os fatos e a entidade denunciada, o local onde ocorreram os fatos (morada e/ou outros pontos de referência), justificação do motivo de denúncia e outras questões relevantes.»

      Se não tivermos um curso de Corte e Costura, ou mesmo de Modelação, vai ser mais difícil. Não digo que a Administração Pública esteja cheia de semianalfabetos — mas os que, na Função Pública, escrevem são semianalfabetos, isso está fora de dúvida. Azar o nosso.

 

[Texto 10 892]

Léxico: «mandeu»

Surpresa nenhuma

 

      Ora, que grande surpresa que a tradutora não conseguisse verter Mandaean, se não está em quase nenhum dos nossos dicionários. É mandeu/mandeia (registem o feminino, ou dá bronca). Como também é mandeísmo, igualmente ignorado. E, contudo, todos estão no VOLP da Academia Brasileira de Letras. «A member of a Gnostic sect of Iraq and south-western Iran, who regard John the Baptist as the Messiah and stress salvation through knowledge of the divine origin of the soul» (in English Oxford Living Dictionaries). Vem do aramaico, a língua semita que Jesus — mera hipótese, julgo — falava. Naquele território e naquela época, século I, falavam-se quatro línguas: aramaico, hebraico, grego e latim.

 

[Texto 10 891]