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Linguagista

Léxico: «bioparque»

Para juntar a «geoparque»

 

      «Chama-se BARK o bioparque projetado para nascer em Vila Nova da Barquinha (Santarém), com mais de 250 animais distribuídos por 43 hectares, em diferentes habitats, num investimento de 70 milhões de euros, revelou hoje o promotor do investimento» («Investimento de 70 ME em bioparque apresentado em Vila Nova da Barquinha», Diário de Notícias, 16.02.2019, 20h46).

      Será, a concretizar-se, o primeiro bioparque em Portugal, mas teremos de esperar até 2021. Ainda hoje falaram do projecto no Portugal em Directo, da Antena 1. Fernando Freire, presidente da Câmara de Vila Nova da Barquinha, entrevistado, falou também em «biovale».

 

[Texto 11 034]

Léxico: «crena»

E mais esta

 

      Outra de Camilo de que acabei de me lembrar: «O regedor tomou o manuscrito de oito páginas entre as mãos, pôs-se em atitude abrindo as pernas em circunflexo, tossiu, tomou fôlego, deu crena de saliva aos beiços, e leu engasgadamente: “De onde vem esta celestial harmonia, que a minha alma ouviu, quando o Céu me bafejava a infância, e as delícias todas da existência me eram pronunciadas nos sonhos?...”» (Amor de Salvação, Camilo Castelo Branco. Porto: Lello & Irmão Editores, s/d, «Colecção Lusitânia», p. 160). Em que dicionário actual aparece esta acepção de crena? Tanto quanto sei, em nenhum. Não tardará, e frases inteiras de autores do século XIX tornar-se-ão incompreensíveis. Alguém está a esquecer-se de fazer o seu trabalho.

 

[Texto 11 033]

Léxico: «cabal»

O enigma

 

      «Nós, os velhos, gostamos de chamar primos aos parentes que já nos são sobrinhos-bisnetos pelos seus justos cabais» (As Três Irmãs, in «Obras de Camilo Castelo Branco», vol. 2, Camilo Castelo Branco. Lisboa: Parceria A. M. Pereira, 1974, p. 287).

      Esforçamo-nos muito para preservar um património único, não haja dúvida. Uma tristeza. A expressão é encontradiça no século XIX e em Camilo, em concreto, que felizmente se está a reeditar mais (nem sempre com os devidos cuidados, porém), mas como substantivo — na acepção do texto camiliano — não está, tanto quanto sei, em nenhum dicionário. Nem Houaiss, nem Sacconi, nem José Pedro Machado, nada. No caso do dicionário da Porto Editora, até falta o animal fabuloso de Java com este nome. Só conhecem o adjectivo. Deixo-vos o enigma.

 

[Texto 11 032]

Léxico: «adornamento»

Isso mais claro

 

      «O sistema inteligente ‘Dynamic Drive’, que gere a suspensão de acordo com o tipo de piso e o estilo de condução, também foi alterado para garantir mais rigidez e impedir o adornamento da carroçaria em curva e melhorar a estabilidade direcional» («Bentayga Speed é o SUV mais rápido do mundo», Rui Faria, «Domingo»/Correio da Manhã, 3.03.2019, p. 19).

      São só 306 km/h de velocidade máxima... Mas temos aqui um problema: no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, em adornamento, este sentido concreto aparece de forma equívoca — ou não aparece: «acto ou efeito de adornar, de pôr adorno em».

 

[Texto 11 031]

Léxico: «(à) armoricana»

Ainda na cozinha

 

      «A base da receita tinha parecenças com a então dominante lagosta à americana (ou armoricana), mas alguns detalhes fazem a diferença: o vinho do Porto indicado é Kopke tinto e no final deve-se polvilhar o molho de orégãos, por exemplo» («Os segredos da lagosta», Ricardo Dias Felner, «Revista E»/Expresso, 9.03.2019, p. 41).

      Diga-se o mesmo: já a encontramos nos dicionários de gastronomia. Nos dicionários gerais, nem raspas.

 

[Texto 11 030]

Léxico: «parrilhada»

Não é nova

 

      «Um dos pratos que mais clientes atraía [ao Pipas, em Cascais] (entre eles Juan de Borbón, pai de Juan Carlos de Espanha) era a parrilhada, uma travessa de marisco grelhado onde não faltava a lagosta» («Os segredos da lagosta», Ricardo Dias Felner, «Revista E»/Expresso, 9.03.2019, p. 41).

      De quando em quando, vejo-a por aí. Com certeza os nossos vizinhos não se zangam: já lhes surripiámos centenas. E já a encontramos nos dicionários de gastronomia.

 

[Texto 11 029]

Léxico: «hipnoterapeuta/hipnoterapêutico»

Um quarto

 

      «Depois acabou por se tornar hipnoterapeuta clínica e no tempo que lhe sobra dedica-se de alma e coração ao teatro, na companhia Fatias de Cá, em Tomar, onde faz o que é preciso dos bastidores à ribalta» («Os Gaspar de Carvalho e os Pinheiro de Azevedo», Fernanda Cachão e João Pedro Ferreira, «Domingo»/Correio da Manhã, 18.11.2018, p. 20).

      O título está errado, é claro, mas não vamos agora tratar do caso. Hipnoterapeuta: o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora só teve paciência ou estaleca para cumprir dois terços do caminho, pois apenas acolhe hipnoterapia e hipnoterápico. Um terço? Um quarto: falta também hipnoterapêutico.

 

[Texto 11 028]

Léxico: «principialismo/principialista»

A cada dez anos

 

      Nem sempre o mundo pula e avança. Há já dez anos que um leitor me perguntou por que razão os nossos dicionários não acolhem principialismo/principialista, termos consolidados da bioética. Dei então eco a essa pergunta e nada aconteceu. Ontem voltou a fazer-me a mesma pergunta. Deixa-nos perplexos tal incúria. Estranheza causa sempre. Também «bioética» não existia antes de 1970. Deixem-me só recordar que na origem do termo «principialismo», que vem do inglês, está o latino principia, daí a grafia.

      «Numa ampla perspectiva e interpretação livre, o “principialismo” é uma denominação genérica que se aplica, por exemplo, ao modelo europeu continental apresentado na “Declaração de Barcelona”, mas também a outros modelo. [...] Este triunfo deve-se, sobretudo, à natureza normativa e pragmática dos modelos principialistas» (Bioética Simples, Maria do Céu Patrão Neves e Walter Osswald. Lisboa: Editorial Verbo, 2007, p. 103).

 

[Texto 11 027]