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Linguagista

Léxico: «vigoréxico»

E claro que faz falta

 

      «Nuno Carneiro concorda com esta distinção: “Não é igual ter uma perceção errada da autoimagem e treinar em excesso para ficar um Adónis, ou treinar duramente para obter resultados sabendo o que já alcançou e lhe falta alcançar”, explica o praticante de artes marciais, que malha muitas vezes com os pés em ferida e à beira das lágrimas pela segunda razão, nunca pela primeira. “Até pode haver dor física e emocional em ambas, mas são caminhos diferentes. Eu próprio cometo muitos erros e não sou vigorético”» («Treinar até doer: o vício que faz sofrer por gosto mas pode fazer mal à saúde», Ana Pago, «DN Life»/Diário de Notícias, 1.07.2019).

      Como já afirmei em relação a outra palavra semelhante, para mim é vigoréxico, porque entendo que se formou na nossa língua com base em «vigorexia». O dicionário da Porto Editora, que regista vigorexia, não acolhe nenhum dos adjectivos.

 

[Texto 11 662]

Léxico: «galgueiro»

Relativo a galgo

 

      «As corridas de galgos têm muitos adeptos no norte do país, onde está sediada a Associação Galgueira e Lebreira do Norte. Fazem parte dos programas de feiras e outros eventos, como ainda recentemente na Expolima — caça, pesca e lazer» («Cruz Vermelha cancela corrida de galgos por pressão da SOS Animal», Paula Sofia Luz, Diário de Notícias, 1.07.2019, 17h41).

      Não tarda nada e até sacudir as moscas de cima de nós será proibido, a mera menção será considerado mosquicídio na forma tentada. Quanto à língua: foi graças à minha sugestão que a acepção de galgueiro relativo a galgo foi para o dicionário da Porto Editora: «que ou pessoa que faz criação de galgos». Agora parece-me evidente que falta outra acepção: «relativo a galgo».

 

[Texto 11 661]

Léxico: «codório»

Má opção

 

      A palavra do dia, na Infopédia, é hoje codório. É mais burlesca do que outra coisa qualquer, mas não está registada como tal. O meu reparo, porém, não vai para esse aspecto, mas para a etimologia: «Do latim quod ore [sumpsimus], frase latina que o sacerdote pronunciava na missa, ao receber, no cálice, vinho e água». Faltou dizer, e parece-me essencial para se perceber tudo, que quod ore sumpsimus significa «o que pela boca tomamos». Temos mais alguma palavra de uso popular tirada de expressões da Igreja? Outra, pelo menos, e muito semelhante: santoro ou santório, que aquele dicionário define assim: «espécie de pão bento que se dá nos dias de Todos os Santos e de Finados». Há textos brasileiros que mostram que também se usou a forma «codoro», o que faz sentido, pois a terminação -oro mudou-se em -ório. Infelizmente, os nossos dicionários apenas acolhem uma das formas, e nem sequer a original.

 [Texto 11 660]

Léxico: «sárquico»

Como se não existisse

 

      A propósito de tríade, desta vez já não as mafiosas, quem ler alguma coisa sobre gnosticismo vai deparar, mais cedo ou mais tarde, com a tríade cristã-gnóstica da pneumática, psíquica e sárquica. Pois, onde vai encontrar explicado o adjectivo sárquico, alguém me diz? Em lado nenhum. Sárquico provém do grego σάρξ (sarx), «carne», e encontramo-lo em obras publicadas em Portugal há largas décadas.

 

[Texto 11 659]

Léxico: «foca-monge-do-mediterrâneo»

Fala-se mais desta

 

      «Muitos porto-santenses quiseram ver o bicho de corpo afunilado, roliço, de olhos negros, vivos, de bigodes enormes, esbranquiçados. Nunca se vira uma foca-monge-do-mediterrâneo (Monachus monachus), também conhecida por lobo-marinho, nas praias daquela ilha» («A foca mais rara do mundo está a recuperar mas não tanto como se pensava», Ana Cristina Pereira, Público, 1.07.2019, p. 32).

      O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora apenas regista foca, foca-cinzenta e foca-leopardo. Tem aqui a oportunidade de fazer melhor.

 

[Texto 11 658]

O AO90 no dia-a-dia

Nem daqui a cem anos

 

      «Os médicos vão passar a ter um guia para atender utentes da comunidade LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros e Intersexo). A medida é inédita na área da saúde e pretende dar aos profissionais um guia de boas práticas nos cuidados a pessoas LGBTI» («Médicos vão ter guia para atender utentes da comunidade LGBTI», Sara de Melo Rocha com Sara Beatriz Monteiro, TSF, 1.07.2019, 11h48).

      Duas Saras, e ainda assim o texto ficou doente: «transgênero», hein? E ainda o tal ministro afirmava que as regras do Acordo Ortográfico de 1990 se aprendiam em 10 minutos... Gostava de ler um texto escrito por ele. Ainda hoje os professores — sim, também os de Português — não dominam as regras, e isto depois de acções de formação, guias e outras formas criativas de esbanjar dinheiro público. Tal como estes guias para os médicos — não bastam a experiência e a sensibilidade?

 

[Texto 11 657]

Léxico: «cabeça-de-lista», de novo

O mundo ao contrário

 

      O Acordo Ortográfico de 1990 foi apenas o último abanão nas já tão frágeis certezas ortográficas: «O líder do partido Chega, André Ventura, será cabeça-de-lista por Lisboa nas eleições legislativas de outubro, enquanto o primeiro candidato no Porto vai ser o militar da GNR Hugo Ernano, que em 2008 disparou mortalmente sobre um jovem de 13 anos durante uma perseguição» («Militar da GNR é cabeça-de-lista pelo Porto», Destak, 1.07.2019, p. 4). «A direcção do PSD pôs fim à especulação e assumiu o nome dos seis primeiros cabeças de lista do partido às legislativas. Entre eles há apenas uma deputada — Margarida Balseiro Lopes — e dois homens — Hugo Carvalho e André Coelho Lima» («Seis primeiros cabeça de lista do PSD: quem é quem», Sónia Sapage, Público, 29.06.2019, 17h23).

 

[Texto 11 656]