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Linguagista

Raças de galinhas

Se é nosso, desprezam

 

      O artigo que acabei de citar («O mito da galinha “do campo”», Luís Ribeiro, Sábado, 21.02.2019) menciona as quatro estirpes de galinhas autóctones portuguesas, nenhuma delas, para o bem e para o mal, alvo da cobiça da indústria: preta lusitânica, amarela, pedrês portuguesa e branca. Estão em risco de extinção. Os nossos dicionários já lhes abreviaram os últimos estertores. O que é nacional é para desprezar, parece ser o lema.

 

[Texto 11 814]

Léxico: «águia-de-cabeça-branca»

Ela merece

 

      «A herdade de White Oaks, nos EUA, uma enorme quinta de galinhas “de pastagem” (em que os animais estão quase permanentemente no exterior), transformou-se no refeitório de águias-de-cabeça-branca» («O mito da galinha “do campo”», Luís Ribeiro, Sábado, 21.02.2019, p. 41).

      A águia-de-cabeça-branca (Haliaeetus leucocephalus), também conhecida como águia-careca, é o animal usado como símbolo dos Estados Unidos da América (bald eagle), mas os nossos dicionários esquecem-na.

 

[Texto 11 813]

Ponto da situação

Como sempre

 

      E assim terminamos a semana. O mundo vai mais ou menos igual. Os medíocres continuam a singrar em todo o lado (alguns confundem acelgas com couves-galegas), graças a nepotismos, amiguismos e outras merdas. O pobre Charles Taze Russell (a Enciclopédia Britânica não se engana) lá vai continuar com o nome estropiado no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora. Muita gente vai continuar a pensar que certas locuções latinas são italianas. Pode ser que alguns destes problemas se resolvam.

 

[Texto 11 812]

Léxico: «capitã»

É assim que as coisas se apresentam

 

      «Capitã do “Sea Watch 3” foi ouvida no âmbito de acusação ao auxílio à imigração ilegal» («Carola disse que não fez nada e foi mandada em paz», Ivete Carneiro, Jornal de Notícias, 19.07.2019, p. 29).

      Desde que se começou, por bons motivos, a subverter certas regras dicionarísticas, esperamos sempre mais. Assim, será que se justifica dicionarizar o feminino juíza, mas não capitã? Porque não?

  

[Texto 11 811]

Léxico: «sangrador»

Dessangrados

 

      «Nos quartos, na enfermaria, na rouparia, todos os aposentos ganham vida. Angelina Brandão faz de freira que adoece. “Há seis anos que me enterro. Já sei isto de cor”, brinca quem ensaia dores deitada na cama. “Passo três dias a gritar. Tenho sempre uma ama de companhia e uma freira comigo. Vem o padre e o sangrador, mas acabo por morrer”» («Freiras, moças e um incêndio para ver no Mosteiro de Arouca», Catarina Silva, Jornal de Notícias, 19.07.2019, p. 22).

      Se acabou por morrer, não lhe vamos desejar as melhoras — desejemo-las antes à Porto Editora, que em sangrador se limita a dizer que é «que ou aquele que sangra» (ora obrigadinho) ou o «matador de animais». Lá se vai a oportunidade de relembrar ou ensinar a importância do sangrador na história da medicina. E, ó Porto Editora, desce à rua, vai aí a uma oficina automóvel, uma Midas ou uma Precision, por exemplo, e pede que te mostrem um sangrador de travões. Aprende, moça.

 

[Texto 11 810]

Léxico: «coma induzido»

Vamos prevenir

 

      «O eurodeputado do PS André Bradford, que estava em coma induzido desde dia 8 deste mês, faleceu esta quinta-feira no Hospital do Divino Espírito Santo, em Ponta Delgada, revelou fonte do PS/Açores» («Morreu eurodeputado do PS que estava em coma há 11 dias», Jornal de Notícias, 18.07.2019, 14h38).

      Ouve-se cada vez com mais frequência a expressão coma induzido, que poucos dicionários registam. O leigo que ouvir isto da boca de um médico vai com certeza alarmar-se se tiver em mente, por exemplo, a definição de coma no dicionário da Porto Editora: «MEDICINA estado de inconsciência que pode assumir diferentes graus de gravidade». Ora, o coma induzido não passa de uma sedação farmacológica profunda.

 

[Texto 11 809]

Léxico: «tubo de fogo»

Ou não se saberá

 

      «O caso remonta a abril de 2015, quando o jovem de 20 anos, que estava a lançar foguetes da visita pascal no jardim de uma casa, na freguesia de Constance, foi atingido pelo rebentamento de um tubo de fogo, tendo tido morte imediata» («Pais de jovem morto sem indemnização», Jornal de Notícias, 19.07.2019, p. 16).

      Na altura, nas notícias falava-se em balona, que é o mesmo engenho pirotécnico, mas ambos deviam estar dicionarizados. (Era um técnico credenciado, um fogueteiro, e pôs a cabeça à frente do tubo de fogo a que já acendera o rastilho? Com 20 anos, técnico credenciado...)

 

[Texto 11 808]

Léxico: «leme»

E as dobradiças?

 

      Há diversos tipos de dobradiças. Olho ali para a porta da minha sala e concluo que são dobradiças de leme, três em cada porta (é de duplo batente). De leme, naturalmente, porque têm um leme — que a Porto Editora já deduziu que não é nenhuma daquelas duas coisas que diz no verbete deste vocábulo. Aliás, faltam-lhe várias acepções. O leme é precisamente a peça central, o ferro da dobradiça macho que encaixa na dobradiça fêmea, cada uma das quais, no caso da porta da minha sala, está fixada à porta e ao aro com seis parafusos. Ou seja, há trinta e seis parafusos a impedirem que a porta caia. Estas dobradiças são muito diferentes, por exemplo, das dobradiças de copo das portas dos móveis da cozinha, ou das dobradiças simples de latão de um pequenino guarda-jóias com embutidos de madrepérola que vejo ali no aparador.

 

 [Texto 11 807]