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Linguagista

Léxico: «barreirista | universíadas»

Há, mas na Galiza

 

      «Corpo franzino, mas homem de rija têmpera, daí fazer parte da equipa que todos os dias monta e desmonta 1200 barreiras nas chegadas da Volta. [...] “É um trabalho duro. Não ando cá só pelo dinheiro, dá gozo, pela amizade e pelo convívio”, atira o “barreirista” natural de São João da Madeira» («Montar e desmontar 1200 barreiras por dia», Teixeira Correia, Jornal de Notícias, 7.08.2019, p. 46).

      O verdadeiro barreirista é o atleta que faz corridas com barreiras, que não encontramos no dicionário da Porto Editora: «Em 1985, Maria José Martínez-Patiño era uma barreirista com futuro promissor no atletismo espanhol. Tinha 24 anos, já com uma participação num Mundial (Helsínquia 1983), e preparava-se para competir nas Universíadas de Kobe» («“As novas regras da IAAF parecem ter prazo de validade”», Marco Vaza, Público, 18.09.2018, 7h00). Como também não regista universíadas. Se queremos saber, temos de recorrer a um dicionário de galego: «s f [DEP] Competición internacional bienal organizada pola Federación Internacional de Deportes Universitarios (FISU), en que participan estudantes universitarios ou alumnos de escolas superiores.»

 

[Texto 11 965]

Léxico: «jerricã»

Até pode ser água do Luso, mas...

 

      «Perante a iminência de uma nova greve dos motoristas de matérias perigosas, os portugueses já começaram a tomar medidas: além de atestar o depósito do carro, levam consigo um extra de combustíveis em bidões (ou jerricãs)» («Greve dos motoristas. Sabe quanto combustível pode levar para casa?» Pedro Mesquita e Marta Grosso, Rádio Renascença, 6.08.2019, 15h21).

      A resposta é 60 litros. Quanto a jerricã. Por coincidência, ainda recentemente estive a consultar o verbete em vários dicionários. No da Porto Editora, lê-se isto: «recipiente portátil para armazenamento ou transporte de líquidos, de plástico ou metal, geralmente em forma de paralelepípedo e de tamanho grande; bidão». Porque não acrescentam, como em vários dicionários de língua inglesa, que é para transportar especialmente combustíveis?

 

[Texto 11 964]

Léxico: «acoli»

Como tantas outras, essa é boa

                      

      Quem é que nunca o usou ou ouviu? E, contudo, está fora de todos os nossos dicionários. Claro que é informal, jocoso, mas que interessa isso? «Não se trata de repassar aqui, a jeito de sabatina ou epítome, fecho glorioso de abóbada, os temas que surgem, acolá e acoli, pelo volume em fora, desenvolvendo alguns, salientando outros» (Textos de Circunstância; seguido de «A PIDE nunca Existiu», Luiz Pacheco. Amadora: Editorial Fronteira, 1977, p. 66).

 

[Texto 11 963]

Léxico: «mecenado»

Sim, também é duplo

 

      «Entre os financiadores da campanha da The Great Decrease, que se apresenta como “uma agência de design e publicidade que visa aumentar a consciencialização sobre questões sociais”, estão um banco privado holandês, o BNG Bank, o Amsterdam Fund for the Arts, uma organização de mecenado suportada pela Câmara Municipal de Amesterdão, e o Stimuleringsfonds Creatieve Industrie, um fundo de capitais estatais holandês» («“Celebrem a baixa natalidade”. Empresa holandesa afixa cartaz polémico em Sintra», Tiago Palma, Rádio Renascença, 5.08.2019, 18h00).

      Os lexicógrafos parecem alérgicos a variantes. Aqui numa velhinha Brotéria (comprei umas dezenas de exemplares — agora só falta tempo para as ler), vejo: «Mecenado, m. Neol. Alto fomento de lêtras e artes: “o mecenado de Leão décimo é o mais famoso na história da cultura humana.”»

 

[Texto 11 962]

Léxico: «microtonal»

Outra música

 

      «Trata-se de uma longa digressão em ritmo irrequieto, quase jazzístico, com múltiplas ramificações sonoras obtidas através de matizes microtonais, técnicas exploratórias e de captação/transformação electrónica ao vivo» («Arte oculta, música viva: ouvir ajuda (da beleza, do tumulto, da vagina)», Manuel Pedro Ferreira, Público, 28.05.2019, p. 36).

      Anda por aí há décadas, até na literatura, mas ainda não chegou ao dicionário da Porto Editora, nem a outros.

 

[Texto 11 961]

Léxico: «iuane»

Menos respeitinho

 

      «Em 1959, o custo por tonelada subiu para 154 iuanes, empurrando a fábrica para um défice de 23 milhões de iuanes, seguido em 1960 por custos de 172 iuanes por tonelada e perdas superiores a 40 milhões de iuanes» (A Grande Fome de Mao, Frank Dikotter. Tradução de Isabel Veríssimo, Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2012, p. 227).

      Vá-se lá saber porque é que os nossos lexicógrafos acham que não é termo aportuguesável. Não é o que se vê.

 

[Texto 11 960]

Léxico: «dragão-marinho-folhoso»

Não andam longe

 

      «São parecidos com cavalos-marinhos e considerados mestres da camuflagem. Dragões-marinhos-folhosos [Phycodurus eques] são os novos inquilinos do Oceanário de Lisboa. [...] Os dragões-marinhos-folhosos são naturais do sul da Austrália e vivem perto de macroalgas e pradarias marinhas. O seu habitat está ameaçado por atividades humanas e pelo desenvolvimento costeiro, como a poluição e descargas de efluentes» («Dragões-marinhos-folhosos. Conheça os novos inquilinos do Oceanário de Lisboa», Rádio Renascença, 5.08.2019, 19h03).

      Mentirosa... Tu só tens o dragão-marinho (Phyllopteryx taeniolatus), ao passo que este é o dragão-marinho-folhoso.

 

[Texto 11 959]

Léxico: «zagaia | mediterraneísmo»

Uma vaga ideia

 

      Zagaia, palavra do dia na Infopédia, é, na segunda acepção (a primeira é pacífica), o «utensílio de pesca em forma de peixe, com uma coroa de anzóis numa extremidade e um aro para introdução da linha na outra». Não tenho a certeza de que se perceba bem do que se trata. Vagamente, sim. Ana Maria Simões da Silva Lopes, autoridade nestas questões do léxico relativo à pesca, descreveu-a assim: «Recorre-se, então, à zagaia, espécie de chumbo pisciforme de uns 15 centímetros, que liga com o fio por uma argola metálica, tendo, na outra extremidade, três anzóis, para a captura do peixe, que, numa corrida cega, se lança vorazmente à isca artificial» («O vocabulário marítimo português e o problema dos mediterraneísmos», in Revista Portuguesa de Filologia, XVI-XVII. Coimbra: Instituto de Estudos Românicos, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1975, p. 240). As palavras cruciais aqui são «espécie de chumbo» e «isca», que faltam na definição do dicionário da Porto Editora.

      Claro que os nossos dicionários também não acolhem o vocábulo mediterraneísmo. Para quê, não é?, os dicionários de língua inglesa é que são bons.

 

[Texto 11 958]