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Linguagista

Léxico: «neurovascular»

Falta sempre um

 

      «O cantor angolano [Anselmo Ralph] de 38 anos de idade não dispensa os óculos devido à doença neurovascular [miastenia grave], que limita a força dos músculos das pálpebras e, por vezes, obriga o músico a fechar os olhos diante dos holofotes e dos flashes» («Irreconhecível! Anselmo Ralph tira óculos escuros e mostra doença nos olhos», Flash!, 16.09.2019, 17h35).

      Ai, ai, por um pouco acertavam: a miastenia grave é uma doença neuromuscular, não neurovascular, como se pode ver, por exemplo, na definição do dicionário da Porto Editora, que, em contrapartida, não acolhe o termo neurovascular.

 

[Texto 11 999]

Léxico: «triterapia»

Três tratamentos diferentes

 

  Creio que desconheceis: «As pessoas que reagem bem aos tratamentos anti-retrovirais contra a SIDA podem ver um marcador-chave do sistema imunitário voltar ao normal, se a triterapia se prolongar o suficiente, indica um estudo hoje publicado na revista médica The Lancet» («Marcador-chave do sistema imunitário pode voltar ao normal se terapia for prolongada», RTP, 19.07.2007, 9h45).

 

[Texto 11 998]

Léxico: «qui-quadrado»

Outra falta grave

 

      «Para a realização dos testes qui-quadrado incluímos os 10 tipos de crime e as principais sanções penais, aqui incluindo a multa» (Percursos Estrangeiros no Sistema de Justiça Penal, Graça Fonseca. Lisboa: Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, 2010, p. 117).

      No dicionário da Porto Editora não o vamos encontrar, essa é que é essa — mas está na entrada teste de Mantel-Haenszel do Dicionário de Termos Médicos. Deve ser por isso que nenhum dos três tradutores da obra que tenho à minha frente o soube escrever. Mais valia terem copiado o original, khi-carré.

 

[Texto 11 996]

Léxico: «sessenta-e-nove»

É experimentar

 

      Vá, aprendam: «Não há qualquer dúvida: o 69 é uma posição sexual que agrada a ambos os participantes na sessão sexual e uma das opções para dar prazer mais icónicas do ‘livro do sexo’. [...] Ao contrário do 69, o 68 é uma nova posição que, ao ser desempenhada, permite dar um prazer intenso a apenas uma das partes envolvidas no sexo. Mas não pense que é só para egoístas, já que podem sempre trocar de lugar depois do orgasmo, por exemplo. A posição envolve que um dos participantes esteja deitado de barriga para cima, joelhos fletidos e pés apoiados no chão. O outro deita-se por cima do peito do primeiro e coloca a cabeça nas coxas deste» («Esqueça o 69! A posição sexual a experimentar é o 68», Women’s Health, Agosto de 2019).

      Há algum motivo para não estar dicionarizado como sessenta-e-nove? No Dictionary of Informal Brazilian Portuguese, de Bobby J. Chamberlain e Ronald M. Harmon (Georgetown University Press, 1983), encontramo-lo assim mesmo, sessenta-e-nove. Querem ver que os estrangeiros percebem mais da nossa língua do que nós próprios?! Então e os dicionários não acolhem, com vários sentidos, o vocábulo trinta-e-um, por exemplo?

 

[Texto 11 995]

Léxico: «lince-europeu»

Não se esqueçam dos sinónimos

 

      «O lince euro-asiático, também conhecido como lince europeu, foi incluído na lista de animais em vias de extinção em Espanha, publicada há quase um ano no Diário Oficial do Estado do Governo espanhol. Esta subespécie de lince distingue-se do lince-ibérico, outra subespécie que habita várias zonas de Portugal e Espanha, por ter um porte maior» («Oito quilos, olhos azuis: pela primeira vez em 100 anos, nasceu um lince-euroasiático [sic] nos Pirenéus», Sofia Neves, Público, 9.08.2019, 18h26).

 

[Texto 11 994]

Léxico: «empena cega»

Atrevida e cega

 

   «Inserido num programa de dinamização urbana, o projecto “Primeira Avenida/Duplo Sentido” dos alunos de mestrado em Arte e Design para o Espaço Público quer levar a arte às empenas cegas da Avenida da República, em Vila Nova de Gaia» («Na Avenida da República, as empenas cegas são agora mostras de arte», Maria João Mesquita, Público, 9.08.2019, 19h57).

   Recentemente, usei a expressão janela cega. Risota do meu interlocutor (não nos esqueçamos de que a ignorância é sempre risonha e atrevida). Lá expliquei. Por acaso, esta locução está no dicionário da Porto Editora, mas não empena cega.

 

[Texto 11 993]

Léxico: «areias | nozes»

Desconhecidas a norte do Tejo

 

      «Mais do que um livro de receitas, Receitas de Reis e Pescadores – Memória e Património Gastronómico do Concelho de Cascais [de Raquel Moreira e Cláudia Silva Mataloto, Casa das Letras, 2017] apoia-se numa investigação em documentos, livros de gastronomia e testemunhos dos habitantes do concelho para citar factos verídicos que envolveram figuras históricas como a Rainha D. Amélia, o Rei D. Carlos ou Luís de Camões. Inclui as famosas “areias” e “nozes”, entre os pratos apreciados pelo rei D. Carlos, e singulares episódios históricos, como o de um homem que terá prometido a Camões umas galinhas recheadas em troca de versos» («Reis, pescadores e as memórias gastronómicas de Cascais», Luís Octávio Costa, Público, 19.12.2017, 12h53).

 

[Texto 11 992]

Léxico: «modal | calcadeira»

É preciso fibra

 

      Um sutiã cujo tecido contém 49 % de modal, 47 % de algodão e 4 % de elastano. E, depois, o fenómeno: modal não está nos dicionários. Boa parte do mundo está fora dos dicionários. Onde pára — já que estive agora mesmo com uma nas mãos — a calcadeira das máquinas de café? Mach bloß keine Fisimatenten.

 

[Texto 11 991]

Léxico: «ais»

Aqui não exprime dor

 

      Ourivesaria luxuosa no Estoril (mas podia ser no Porto). No escaparate, uns brincos de criança (umas argolinhas fininhas de ouro) que a crendice popular afirma proteger contra o mau-olhado (era bom, era: venha de lá uma dúzia): na etiqueta lê-se que se trata de ais. Ais porque a criança — pudera! — chora e diz «ai» quando lhe furam as orelhas. Nos dicionários, ai, ai, não vemos estes ais.

 

[Texto 11 990]

Léxico: «conina»

Codornizes e dicionários

 

      Sabem porque é que os Israelitas, depois da grande escassez que se seguiu à saída do Egipto (c. 1400-1300 a. C.), caíram como tordos quando comiam codornizes? Não sabem? Então, leiam a Bíblia (Nm 11,32-33). Noutro livro das Sagradas Escrituras encontrarão esta cominação: «Não comereis nenhum animal morto» (Dt 14,21). Ora, apanharam as codornizes na sua migração primaveril, quando há escassez nos campos e aquelas aves lançam mão — enfim, pata ou bico — de tudo, incluindo ervas venenosas, e entre elas a cicuta, que contém um alcalóide, a conicina, ou conina, ou cicutina. Este intróito serve apenas para falar da definição de conina no dicionário da Porto Editora: «FARMÁCIA alcalóide muito venenoso extraído da cicuta, também denominado conicina, conina, etc.» Primeiro: não tem de estar submetido ao domínio farmácia (ou perguntem aos desgraçados que ficaram com as codornizes nos dentes) nem se tem de dizer que é extraído da cicuta. Não: é um alcalóide que a cicuta contém.

 

[Texto 11 989]

Léxico: «mopa»

Como o aristo, claro

 

     Há muito que mopa já não é somente marca — há mopas de diversas marcas. Não se justifica, assim, que continue fora do dicionário da Porto Editora, tanto mais que — ó incoerência! — está num dicionário bilingue. Bodenwischer. Eh, pá, isto é como aristo, ou gilete, entre tantas outras.

 

[Texto 11 988]

Léxico: «videoconsulta»

Ainda não

 

      «Já pode ter uma consulta sem ter de se deslocar a um hospital, mesmo que não tenha seguro de saúde. Com a portuguesa Knok, basta descarregar a aplicação, inserir a sua localização e procurar um médico da especialidade para fazer um videoconsulta. Além de fazer diagnósticos, o profissional de saúde também pode prescrever medicamentos ou exames através da aplicação» («Um médico na palma da mão», Juliana Nogueira Santos, Sábado, 17.04.2019, p. 81).

 

[Texto 11 987]

Léxico: «castores»

Paços de Ferreira

 

      «O defesa-central Maracás e o avançado Rafael Teixeira, ambos brasileiros, foram ontem oficializados como reforços do Paços de Ferreira. O primeiro comprometeu-se com os castores por três temporadas, ao passo que o dianteiro assinou um vínculo de duas épocas» («Maracás e Rafael já são castores, A Bola, 5.07.2019, 10h52).

      No dicionário da Porto Editora, castores só mesmo os simpáticos mamíferos roedores anfíbios.

 

[Texto 11 986]