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Linguagista

Léxico: «polionomásia»

É dos demónios

 

       A polionomásia que se usa, em português, para designar o Demónio (ou, paralelamente, a sinonímia para referir o pénis, ou a vagina, ou o marido atraiçoado, por exemplo) é verdadeiramente impressionante. Menos impressionante é polionomásia não figurar nos nossos dicionários. Acolhem poliónimo, e já não é mau — ou já é um pau, expressão, muito usada por mim e por A. Lobo Antunes, que também não vejo dicionarizada).

 

[Texto 12 213]

Léxico: «interconectar»

Pela metade

 

      «Este é um dos exemplos dados pelos autores de um mapa das “auto-estradas” do ódio nas redes sociais — grupos que estão interconectados globalmente nessas vias, que atravessam diferentes países, continentes e línguas, facilitando assim o alastramento do ódio. Num artigo científico publicado na última edição da revista Nature, a equipa sugere ainda quatro estratégias para se combater essas auto-estradas. [...] Para perceber como funcionavam, a equipa começou por mapear a forma como os grupos se interconectavam, espalhavam narrativas e atraíam novos membros no Facebook e no VKontakte» («Traçado mapa de “auto-estradas” do ódio nas redes sociais», Teresa Sofia Serafim, Público, 27.08.2019, p. 31).

     Ao adjectivo ainda o encontramos no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora; quanto ao verbo, só em bilingues. (Aumentar a dose de Memofante Forte.)

 

[Texto 12 212]

Léxico: «rito zairense»

Os ritos

 

      Na sequência do Sínodo Pan-Amazónico, não é improvável que a Santa Sé aprove um rito amazónico. Como já existe, afinal, há décadas um rito zairense, que mais não é do que a adaptação congolesa do rito romano, promovido pelo cardeal Malula (1917-1989), arcebispo de Kinshasa, e aprovado em 1988. No dicionário da Porto Editora, na entrada rito só encontramos os ritos orientais, e pronto, quanto a ritos é tudo.

 

[Texto 12 211]

Léxico: «acordo-quadro»

Agora da Santa Sé

 

      Como não sabem, a Santa Sé e a República de Angola assinaram recentemente um acordo-quadro que define o quadro jurídico das relações entre a Igreja Católica e aquele Estado lusófono. Ora bem, veja-se a definição de acordo-quadro no dicionário da Porto Editora: «DIREITO contrato celebrado entre entidades ou operadores económicos com o fim de regular as relações contratuais futuras a estabelecer ao longo de um dado período, fixando os respectivos termos antecipadamente». Os Estados não deixam de ser entidades, mas era conveniente que o termo «Estados» aparecesse na definição. Por causa das dúvidas.

 

[Texto 12 210]

Léxico: «paratáctico»

De parataxe

 

      «A leitura antológica de Os Lusíadas, como de qualquer outra epopeia, mesmo se de arquitectura ostensivamente paratáctica, suscita o problema central de toda a hermenêutica: a análise, a ponderação, o conhecimento das relações da parte com o todo e do todo com as partes, ou seja, a problemática do círculo hermenêutico» (A Lira Dourada e a Tuba Canora: novos ensaios camonianos, Vítor Manuel de Aguiar e Silva. Lisboa: Livros Cotovia, 2008, p. 98).

      Se os dicionaristas não contribuírem mais decisivamente para registar e definir todos estes termos, a língua sai enfraquecida do permanente influxo de vocábulos estrangeiros — justamente porque os falantes não encontram os que deviam usar onde eles deviam estar.

 

[Texto 12 209]

Léxico: «jdanovismo | jdanovista»

A estética realista-socialista

 

      Outro par que tenho encontrado por aí em obras sobre literatura e que nenhum dicionário de português acha relavante: jdanovismo e jdanovista. É uma referência a Andrei Jdanov (1896-1948), comissário de Estaline e seu braço-direito que pretendia regular estética e ideologicamente a produção cultural e propaganda comunistas. Por acaso, na Infopédia temos (com erros ortográficos) uma entrada «Doutrina Jdanov».

 

[Texto 12 207]

Léxico: «vidro»

Também estilhaçado

 

      Não escreveu Alice Gomes (1910-1983) um livro infanto-juvenil com o título Vidrinho de Cheiro, aí por início da década de 1970? Ora, no dicionário da Porto Editora esta acepção de vidro não está registada, e isto quando até acolhe vidrinho e a expressão «ser um vidrinho de cheiro» (mas, incongruentemente, no verbete vidro encontramos um «vidro-de-cheiro»). Vidro pode ser o material, o recipiente para líquidos feito com esse material e o próprio conteúdo. Subtraíram-nos a segunda acepção. (Lembrete: retomar a toma diária de Memofante Forte.)

 

[Texto 12 206]