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Linguagista

Léxico: «sobretom»

Até na música

 

      «O peito bem arcado, de fôlego fundo, como um fole de forja; as mãos ainda escuras, ásperas, apesar do longo contacto com a alvura e doçura das hóstias; o carão cor de couro curtido, comum sobretom azul nos queixos escanhoados...» Chega, chega, e que Eça de Queiroz nos perdoe. Então sobretom até é usado como termo musical e os nossos dicionários assobiam todos para o lado?

 

[Texto 12 286]

Léxico: «lixiviado»

Dantes, caramelos; agora, palavras

 

      «Nestas declarações, este especialista [Nuno Forner, especialista em geologia da associação ambientalista Zero] lembra que o impacto ambiental está relacionado com lixiviados e sedimentos finos que podem contaminar as linhas de águas. “Há forma de minimizar, mas neste momento garantirmos que não vamos ter qualquer contaminação poderá ser complicado”, sublinha» («Minas de lítio. “É uma exploração que não devemos fazer a qualquer custo”», Rádio Renascença, 13.11.2019, 10h33).

      Pois evidentemente — é um substantivo, ao contrário do que se lê nos nossos dicionários. Temos então de lhes apontar o Dicionário da Real Academia Espanhola: «m. Ecol. Líquido residual, generalmente tóxico, que se filtra de un vertedero por percolación.»

 

[Texto 12 285]

Léxico: «grifo-de-rüppell»

Entretanto, em Bruçó

 

      «Investigadores da Palombar, uma associação transmontana que se dedica à conservação da natureza, registou a presença de um “raro” grifo-de-rüppell (Gyps rueppellii), em Bruçó, no concelho de Mogadouro, revelou hoje à Lusa o biólogo José Pereira. “Trata-se de uma espécie de ave rupícola (grifo/abutre) que se encontra ameaçada no mundo, tendo sido registada a sua presença, num campo de alimentação para aves necrófagas em Bruçó, em Pleno Parque Natural do Douro Internacional [PNDI]”, indicou o técnico da Palombar» («Espécie rara de abutre avistada em Mogadouro», TSF, 12.11.2019, 14h29, itálico meu).

 

[Texto 12 284]

Léxico: «petagrama»

Medida de massa

 

      Bem pode aqui este autor falar dos petagramas de carbono que se acumularam nos solos e turfeiras das regiões setentrionais — os nossos dicionários não registam petagrama. Vá um ponto de exclamação: !. Um petagrama (Pg), meus meninos, é uma fracção decimal múltipla da unidade de massa básica no quilograma do Sistema Internacional de Unidades: 1 Pg = 1015 g. Pois, não é «metagrama» nem «pentagrama».

 

[Texto 12 283]

Léxico: «cervunal | covão | nave»

Na serra da Estrela

 

      «Tradicionalmente a pastorícia do gado ovino era a actividade dominante, aproveitando em regime transumante os prados naturais ou cervunais que surgem nas depressões dos covões e das naves, nomes populares para morfologias glaciares bem determinadas e que abundam na toponímia da Estrela», lia-se num dos painéis do Ecomuseu do Zêzere, instalado na antiga Tulha dos Cabrais, em Belmonte.

      O dicionário da Porto Editora nem sequer um destes termos, nestas acepções, acolhe. Ora, já José Leite Vasconcelos se ocupou dos últimos dois: «Tanto nave como assentada designam vastos descampados, mas, segundo o que inferi da explicação do tio Jerôlmo, a nave tem serras em volta, e a assentada não tem. O covão é um vale profundo» (De Terra em Terra. Imprensa Nacional, 1927, p. 178). Quanto a cervunal, é o nome dado às pastagens de montanha, por nelas abundar sobretudo a Nardus stricta (cervum ou nardo), gramínea perene.

 

[Texto 12 282]

Léxico: «termobatedeira | mosto | contra-safra | padejar»

Visto por mim

 

      «A pasta segue agora para uma termobatedeira. Aquecida a uma temperatura que nunca deverá ultrapassar os 26 ºC para que se possa dizer que o azeite foi extraído a frio, a pasta sofre, durante uma hora, um processo de homogeneização das gotículas de azeite contidas na azeitona» (Os 100 Melhores Azeites de Portugal, Edgardo Pacheco. Alfragide: Lua de Papel, 2016, p. 27).

      É precisamente o que vi no Museu do Azeite de Belmonte: «A primeira operação a realizar é a moagem das azeitonas, tendo a tina uma capacidade para 400 a 500 kg de frutos. Sendo triturada pelas galgas (mós), a pasta era depois transportada para a termobatedeira. Este equipamento consiste num contentor, envolvido por um reservatório de água quente, onde a pasta era constantemente misturada; logo que a mesma estivesse a uma temperatura adequada era colocada nas vagonetas e enviada para a prensagem.» A pasta obtida pela prensagem (em três prensas hidráulicas, em camadas sucessivas, sobre 63 ou 64 seiras, formando o que se designava por castelo) era um mosto oleoso — lia-se nas legendas, mas o dicionário da Porto Editora, que, como outros, não regista o vocábulo termobatedeira, diz-nos que mosto é somente o sumo da uva ou «suco de qualquer fruta que contenha açúcar, quando em fermentação». Mesmo em galga («mó de lagar de azeite») devia especificar que se trata de mós cilíndricas. Também fiquei a saber (ou a recordar) que para a obtenção de um litro de azeite se necessitam 7 kg a 9 kg de azeitona. Voltei a ver a palavra contra-safra («mau ano de produção de azeitonas», lia-se nas legendas), mas o dicionário da Porto Editora só regista com a grafia do AO90, «contrassafra». Padejar, que aquele dicionário define como «revolver com a pá (os cereais) para retirar a moinha», também é explicado como «acto de atirar azeitonas recém-colhidas ao ar, como forma de libertar os ramos caídos durante o varejar».

 

[Texto 12 281]