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Linguagista

Léxico: «supralinear»

Na Lua

 

   Um autor fala em «notas supralineares»; outro, a propósito da riqueza da rede social humana (que, por exemplo, nos últimos cinco anos, se viu enormemente reforçada com o turismo em Lisboa, por exemplo), de um padrão a que os matemáticos também chamam supralinear. Entretanto, o dicionário da Porto Editora anda lá perto — supralunar.

 

[Texto 12 357]

O pobre verbo «faltar»

E desses erros, quem nos livra?

 

      «Ontem, depois de horas de festejos pelas ruas do Rio de Janeiro, inundadas de adeptos de vermelho e preto, Jesus e o Flamengo sagraram-se campeões do Brasil, depois do Grémio vencer o Palmeiras. Isto quando ainda faltam disputar quatro jornadas (o próximo jogo do Fla é quarta-feira)» («Joacine livra-se do Livre? Livra!», Martim Silva, Expresso Curto, 25.11.2019).

      Se bem que o Expresso, em especial o que vai publicando ao longo do dia no sítio da Internet, seja actualmente uma nódoa, a ponto de nem sequer merecer ser citado seja para que fim for, convém de quando em quando lembrar quem lá trabalha, em especial quem tem maior responsabilidade, que cometem outros atropelos bem piores do que a trapalhada do Acordo Ortográfico de 1990 que atiram para cima do leitor (grande respeito...), e piores porque mais elementares e, contudo, mais fundamentais. Martim Silva, director-adjunto, devia saber que não se diz «faltam disputar», é um solecismo. Vejamos: o sujeito do verbo «faltar», que é pessoal, é outro verbo, o verbo «disputar», que está no infinitivo. O valor nominal do verbo no infinitivo exige assim que o verbo «faltar» esteja no singular: «falta disputar quatro jogos». Difícil?

 

[Texto 12 356]

Léxico: «de feito»

É mesmo defeito, sim

 

      «A desgraçada tinha, de feito, enlouquecido», escreve Machado de Assis em Quincas Borba. O problema é que os nossos dicionários se esqueceram de acolher esta locução de cunho literário, sinónima da locução «de facto». Por este andar, ainda um dia os livros serão ilegíveis.

 

[Texto 12 355]

Léxico: «ostiariado»

Antigas?

 

      «A Igreja do Algarve conta, desde esta noite, com um novo acólito e um novo leitor instituídos pelo bispo do Algarve no decurso da eucaristia de encerramento do Lausperene, na nova igreja matriz de Almancil. D. Manuel Quintas instituiu o seminarista António de Almeida, natural de Tavira e a frequentar o 6.º ano do curso de Teologia, no ministério de acólito e o seminarista Fábio Pedro, natural de Loulé e a frequentar o 5.º ano do mesmo curso, no ministério de leitor» («Bispo do Algarve instituiu acólito e leitor no encerramento do Lausperene», Samuel Mendonça, Folha do Domingo, 19.11.2017).

      Como sabem, esta acepção de leitorado foi recentemente acolhida, por sugestão minha, no dicionário da Porto Editora: «aquele que tem a segunda das quatro antigas ordens menores da hierarquia eclesiástica». A questão, desta vez, prende-se com a definição: porquê «segunda das quatro antigas ordens menores da hierarquia eclesiástica»? Bem sei que é o que se lê em todos os dicionários, mas estará correcto? O que de certeza está errado é acolher somente «ostiariato», quando ostiariado é mais conforme à nossa língua.

 

[Texto 12 354]

Léxico: «extratropical»

Há-de ser por inveja

 

      «A tempestade tropical “Sebastien” deve atingir os Açores como depressão extra-tropical e deverá passar próximo do grupo ocidental, sob aviso laranja durante esta noite, tendo sido emitido aviso amarelo para todas as ilhas para segunda-feira» («Açores. Tempestade “Sebastien” chega na noite deste domingo como depressão extra-tropical», Rádio Renascença, 24.11.2019, 16h30).

      Está, por exemplo, no VOLP da Academia Brasileira de Letras; nos nossos dicionários, nada, isto quando pelo menos na redacção da Rádio Renascença fazia muita falta.

 

[Texto 12 353]

Léxico: «convencional»

Séculos depois

 

      «Aprovada a Constituição em plebiscito fracamente concorrido, a Convenção dissolveu-se (26 de outubro de 1795) mas sem determinar que, nas primeiras eleições para os novos conselhos, dois terços dos eleitos tivessem de ser escolhidos de entre os convencionais que assim procuravam prolongar o seu domínio ou fazer valer a sua dolorosa experiência» (Direito Constitucional, vol. 1, Marcello Caetano. Belo Horizonte: Mandamentos, 1977, p. 131).

      Parece que a Porto Editora faltou a esta aula de História — o vocábulo nem sequer surge como substantivo.

 

[Texto 12 352]

Léxico: «cervo-rato | rato-cervo»

Vá, não confundam

 

      «Um cervo-rato, espécie que os cientistas tinham dado como extinta há três décadas, foi captado por câmaras escondidas numa floresta no Vietname. As imagens do animal, também conhecido pelos dois tons distintos do seu pêlo, são as primeiras a serem captadas em plena natureza. O cervo-rato foi o primeiro mamífero do top 25 das espécies perdidas mais procuradas pela Global Wildlife Conservation a ser encontrado» («Espécie de cervo-rato redescoberta 30 anos depois de ter sido dada como extinta», Sofia Freitas Moreira, Rádio Renascença, 11.11.2019, 23h43).

      Há sempre esperança. Trata-se de um trágulo, termo que o dicionário da Porto Editora acolhe, mas não regista nem cervo-rato (Tragulus javanicus) nem rato-cervo (Peromyscus).

 

[Texto 12 351]

Léxico: «pré-frontal | frontal | pós-frontal»

O que agora não sucede

 

      «“Para amanhã [sábado], está prevista descida da temperatura entre dois e cinco graus. Vamos ter um ar polar associado a um pós-frontal. Estão previstos aguaceiros, em especial nas regiões do norte e centro, que poderão ser de neve acima dos 1.300/1.500 metros”, disse» («Chuva está “para lavar e durar” e temperatura baixa no sábado», Rádio Renascença, 22.11.2019, 10h00).

      Estes três termos — pré-frontal, frontal, pós-frontal — têm de passar a figurar nestes sentidos nos nossos dicionários.

 

[Texto 12 350]