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Linguagista

Definição: «solicitador»

Não se percebe a diferença de tratamento

 

      «A formação de advogados e solicitadores é a mesma? Não necessariamente. Embora ambos possam exercer com uma licenciatura em Direito, esta não é obrigatória no caso dos solicitadores, que podem ter, em alternativa, formação superior em Solicitadoria. O exercício da profissão depende da inscrição na respetiva ordem» («Guerra entre ordens impede milhares de dar apoio judiciário», Inês Banha, Jornal de Notícias, 29.12.2023, p. 14).

      Menorização que também passa, ora pois claro, pelos dicionários. Assim, para o dicionário da Porto Editora, se advogado é o «indivíduo formado em Direito e legalmente habilitado a exercer o mandato judicial e outras funções de carácter técnico e jurídico como profissão»; já o solicitador é apresentado quase como mero curioso, sem formação específica, pois é definido como o «profissional liberal que pratica actos de procuradoria (registos, preparação de escrituras, etc.) por conta e no interesse de clientes, podendo ainda exercer mandato judicial com certas limitações legais». Também fora dos dicionários estão os agentes de execução, que são igualmente formados ou em Direito ou em Solicitadoria. Nos dicionários, só agente duplo e agente secreto, que, como é bem sabido, abundam por aí.

 

[Texto 19 214]

 

P. S.: Em tetra-cego, «noroeste» tem de ser grafado com maiúscula: «no Noroeste do território mexicano». Nos jornais, é erro de todos os dias, e em livros revistos também é visto, ora pois. Regressemos às basezinhas. No caso, a XLI do Acordo Ortográfico de 1945: «Os nomes dos pontos cardeais e dos pontos colaterais, que geralmente se escrevem com minúscula inicial, recebem, por excepção, a maiúscula, quando designam regiões: o Norte do Brasil; os mares do Sul; os povos do Oriente; as terras do Levante; o Ocidente europeu; o Noroeste africano; a linguagem do Nordeste

 

Léxico: «ciberrapto»

Só faltava isto

 

      «Um estudante chinês foi encontrado com vida nos Estados Unidos, depois de os seus pais terem sido extorquidos em dezenas de milhares de euros num esquema conhecido como “ciber-rapto”» («EUA. Adolescente chinês vítima de “ciber-rapto” encontrado com vida», Marta Pedreira Mixão, Rádio Renascença, 2.01.2024, 16h00). Uma nova, e estúpida, forma de extorsão? Por enquanto, em língua portuguesa há escassíssimos casos de uso do termo; em língua inglesa, já se contam em milhões. Estreia-se por cá muito mal, escrita de forma incorrecta. Até pode não ser digno de ir engrossar os dicionários (mas já veremos, nada de pressas), mas convém, que diacho, grafá-lo correctamente.

 

[Texto 19 213]

Léxico: «broncoaspiração»

Ou está a escapar-me alguma coisa?

 

      «“Lo primero será asegurarse que no está del todo inconsciente. En segundo lugar, no debemos dejar sola a esa persona en ningún momento. Si acaba por irse a dormir, la colocaremos en una posición que no sea peligrosa. Es decir, ni boca arriba, ni tapado excesivamente. En el caso de que haya un vómito, es bueno que esté de lado para evitar la broncoaspiración —que ese vómito pase a la vía respiratoria y se ahogue—“, señala el internista del CHUS. En caso de que el estado de consciencia mejore, intentaremos hidratarla, ofreciendo un poco de agua. También algún tipo de alimento, “aunque sea solo un poquito de azúcar y siempre que no haya riesgo de que vomite”, recalca Novo» («Cómo actuar ante un coma etílico», Lois Balado, La Voz de Galicia, 31.12.2023, p. 40).

      Trata-se, com efeito, da entrada de substâncias estranhas, tais como alimentos e saliva, nas vias respiratórias, mas o dicionário da Porto Editora só acolhe outra acepção: «aspiração, com o auxílio do broncoscópio, de líquido ou mucosidades do interior dos brônquios». Outra acepção ou erro? Só pode ser erro, pois em broncoscópio dizem que é o «instrumento usado para observação do interior dos brônquios».

 

[Texto 19 212]

Léxico: «vala mecânica»

E não só comum

 

      «Nuno Neto foi um dos arqueólogos que estiveram envolvidos nesses trabalhos, juntamente com João Santos e Vanessa Mata. Recuando às diferentes fases, o arqueólogo recorda que, em 2020, se fez o diagnóstico arqueológico manual do local durante dois meses. Depois, abriu-se uma vala mecânica (isto é, foi feita uma sondagem arqueológica com o auxílio de meios mecânicos) para se perceber a dimensão do sítio» («Desvendado abrigo da pré-história em obras para casas de renda acessível», Teresa Serafim, Público, 3.01.2024, p. 15). (Claro que é Pré-História que se escreve, e muito me estranha que uma jornalista com tarimba não o saiba. Ou saberá, mas não pratica, o que é muitíssimo pior.)

 

[Texto 19 211]

Léxico: «arco vulcânico»

Não apenas em enciclopédias

 

      «O Japão integra o temido Anel de Fogo do Pacífico, uma área em forma de ferradura de grande actividade geológica. As fossas oceânicas, arcos vulcânicos e os movimentos de placas tectónicas dão origem a sismos, erupções vulcânicas e por vezes tsunamis. Cerca de 90% de todos os sismos e 81% dos grandes terramotos acontecem nesta área com 40 mil quilómetros» («Engenharia, regras de construção, simulacros e detecção precoce», Miguel Dantas, Público, 3.01.2024, p. 19). Não irá destoar nadinha, garanto, ao lado de edifício vulcânico e rocha vulcânica.

 

[Texto 19 210]

Léxico: «oncopediatria | oncopediátrico»

Também nossos

 

      «Así, el doctor Calvo subrayó la “firme evidencia” de la ventaja de la protonterapia frente a la radioterapia con fotones o electrones en pacientes oncopediátricos, ya que “protege la neurocognición en el caso de tumores cerebrales, y potencia la tolerancia hematológica evitando significativamente la radiación de la sangre circulante, lo cual protege la autodefensa del paciente» («Un tratamiento “con un futuro extraordinario”», La Voz de Galicia, 3.01.2024, p. 24).

 

[Texto 19 209]

Léxico: «lapónico | sámi»

Tempo de agir

 

      «Na terça-feira, em Nikkaluokta, uma aldeia habitada pelo povo indígena sâmi [ou lapões] no norte da Suécia, registou uma temperatura de -41,6º Celsius. A vila fica na Lapónia, região que se estende desde o norte da Noruega, passando pela Suécia e Finlândia, até a Rússia» («Frio extremo atinge os países nórdicos. Suécia registou a temperatura mais baixa no mês de janeiro em 25 anos», Expresso, 3.01.2024, 18h50).

      Temos lapão, lapónio, lapónico (tem-no, este último, Rebelo Gonçalves1, não o tem a Porto Editora), e talvez chegasse — mas, se insistem mesmo em usar este, é melhor optar por sámi, evidentemente, com ares menos brasílicos.

 

[Texto 19 208]

 

 

1 «lapónico (id.), adj. e s. m. Como s. m., é a forma correcta de designar a língua dos Lapões: diga-se o lapónico, e não o lapónio ou o lapão. V. lapónio e lapão» (p. 595).

 

Léxico: «esquema [de] Ponzi»

Até os dicionários podem ajudar

 

      «O esquema Ponzi (que recebeu o nome do seu inventor no início do século passado, Charles Ponzi) está na origem de dezenas de fraudes e prisões pelo Mundo fora. Consiste em promessas de lucros extraordinários que vão sendo pagos com o dinheiro dos novos investidores, até que estes começam a falhar. As verbas aplicadas deixam de ter retorno e as dívidas acumulam-se até a “bolha” rebentar» («“Ponzi” com cadastro em todo o Mundo», Jornal de Notícias, 1.01.2024, p. 14).

 

[Texto 19 207]

 

P. S.: Então se influenza é um termo estrangeiro, porque é, e como tal está grafado no respectivo verbete do dicionário da Porto Editora, no verbete de gripe tem de ser corrigido: «MEDICINA doença febril, muito contagiosa, epidémica, de duração curta, que se manifesta principalmente por febre, cefaleias e atingimento das vias respiratórias, também denominada influenza».