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Linguagista

Léxico: «alfaia offset»

Ficamos a saber esta

 

      Há quase sempre uma forma de dizer as coisas, podemos é não a conhecer: «Preocupados com os números da sinistralidade com máquinas agrícolas, conversaram sobre as “dificuldades em mantê-las estáveis quando trabalham com alfaias offset (acopladas na parte da frente)” e deitaram mãos à obra» («Sistema hidráulico pode evitar acidentes», Eduardo Pinto, Jornal de Notícias, 26.05.2024, p. 17).

 

[Texto 19 846]

Léxico: «dimetiltriptamina | ayahuasca»

Chegou pelo correio

 

      «Segundo revelou ontem a PJ, “o suspeito foi surpreendido junto à sua residência, quando recebia uma encomenda proveniente do Brasil, por via aérea, cujo conteúdo se encontrava carregado com cerca de 4,5 quilos de dimetiltriptamina, um poderoso alucinogénio conhecido como ayahuasca”» («Detido quando recebia 4,5 quilos de “ayahuasca”», R. P., Jornal de Notícias, 25.05.2024, p. 22). Ou seja, também servirá para melhorar a definição de ayahuasca, indicando-se que é o seu princípio activo.

 

[Texto 19 845]

Léxico: «tóxico»

Não tenho pressa, mas...

 

      «Os relatos descrevem também um ambiente tóxico, de medo e silenciamento dentro do CES. As pesquisadoras dizem que os comportamentos impróprios do professor eram normalizados e até abafados dentro do centro académico» («Investigadoras deixam anonimato e contam que sofreram assédio de Boaventura de Sousa Santos», Mariama Correia, Expresso, 23.05.2024, 16h29). «Se a “obrigação” da virgindade oprimia as mulheres, a liberdade sexual poderia ter efeitos catastróficos numa cultura masculina altamente tóxica, nomeadamente quando havia lhos que nasciam fora do casamento, sustentados muitas vezes apenas pelas mães (e apenas educados por elas, porque o desaparecimento do pai era uma constante)» («Boaventura e as mulheres: as histórias das vítimas são asquerosas», Ana Sá Lopes, Público, 26.05.2024, p. 32). Andamos (quem o faz) há anos a usá-lo quotidianamente neste sentido, em que é um anglicismo semântico, pelo que os dicionaristas não vão poder continuar a ignorá-lo por muito mais tempo.

 

[Texto 19 844]

Os nossos avôs

Dizem bem

 

      É como muita gente diz (neste caso, como é óbvio, não temos a certeza de que não está por «avós»), e têm razão, como já defendi aqui: «“Ponha a cabeça sem medo. Tem de se entrar na paisagem sonora” — quem o pede é Inês Vidal, uma das curadoras da mostra Já cheira a carvalho das aduelas e a vinhos de armazém. Espreita-se então para dentro da cuba e vêem-se várias embalagens da antiga Sociedade Abel Pereira da Fonseca. Entre elas, há uma garrafa de vinho rosé em forma de cabaça ou uma embalagem de plástico para vinagre marcada pela passagem do tempo. “É uma embalagem que transporta muitas pessoas para a casa dos avôs”, diz Mauro Santos, o outro curador» («Nesta mostra viaja-se até outra Lisboa através de embalagens da Abel Pereira da Fonseca», Teresa Serafim, Público, 28.05.2024, p. 19).

 

[Texto 19 843]

Aspiracional, confrontacional e por aí fora

Não tenham tanta certeza

 

      «Muitas vezes factos e situações diferentes só podem ser bem entendidas se forem analisados em conjunto. É o caso das medidas fiscais de apoio aos menores de 35 anos, da prevista redução do IRC e do IRS e do resultado das eleições na Madeira no passado domingo. No centro desta reflexão conjunta vai estar um tema clássico, que justificou milhares de páginas e de horas de ensino e de debates. Estou a falar na tensão entre posições aspiracionais e reflexos de resignação» («As Causas. Aspiracionais ou resignados?», José Miguel Júdice, Expresso Diário, 21h00).

      O texto não tem menos de uma dúzia de vezes a palavra «aspiracional» — que foi, não inspirada, mas decalcada do inglês aspirational. Bem, nada de especial, acontece com muitas outras. O que me causa estranheza é que outras, tidas por anglicismos, mas que afinal podem ter nascido dentro da nossa própria língua por um processo de derivação, como confrontacional, nem sequer estão dicionarizadas.

 

[Texto 19 842]

Tradução: «frociaggine»

Ah e tal, não quis ofender

 

      «O Papa Francisco pediu desculpas pelas declarações que terão sido feitas numa conversa privada, com os bispos da Conferência Episcopal Italiana. Em causa, estarão comentários depreciativos sobre a admissão de homossexuais nos seminários que terão gerado polémica nos últimos dias. De acordo com a imprensa italiana, Francisco terá dito que haveria demasiados “frociaggine” em alguns seminários, um termo que pode ser traduzido como “bichas”» («Papa Francisco pede desculpas. “Não quis ofender ou expressar-se em termos homofóbicos”», Rádio Renascença, 28.05.2024, 15h15). Nem o papa resiste, faz parte da natureza humana. Olhem, ficam a conhecer o termo italiano para bichice ou panasquice (e não para «bichas», como se lê no artigo).

 

[Texto 19 841]

Léxico: «caquesseitão»

Ele é mais do que isso

 

      «O aquamanil “Caquesseitão” – objeto de prata utilizado para lavagens rituais das mãos que representa uma ave fantástica” – levado a leilão na noite desta segunda-feira, foi vendido por 85 mil euros. Um valor ligeiramente superior ao patamar mínimo de licitação, fixado em 80 mil euros, no catálogo da leiloeira Veritas, que levou a peça à praça» («O aquamanil que esteve para ser classificado foi vendido, mas fica em Portugal», Christiana Martins, Expresso Diário, 28.05.2024, 19h30).

      É certo que o encontramos no dicionário da Porto Editora, mas a profusão de pormenores de Fernão Mendes Pinto é muito maior, pois diz que o caquesseitão é «do tamanho de hũa grande pata, muyto pretos, conchados pelas costas, com hũa ordem de espinhos pelo fio do lombo do comprimento de hũa penna de escreuer, & com azas de feição das do morcego, co pescoço de cobra, & hũa vnha a modo de esporaõ de gallo na testa, co rabo muyto comprido pintado de verde & preto, como saõ os lagartos desta terra». (Espero que apreciem devidamente as ligaturas, assim como o til onde deve ser, em cima do u de hũa — e não ao lado, «h~ua», como o vejo por aí. Dificuldades...)

 

[Texto 19 840]