Verbo «haver»
Deslizes latinos
Lapsus linguæ, «erro da língua», não tem que se lhe diga. Já quanto a lapsus calami, «erro da pena», Júlio Moreira sentiu-se na necessidade de explicar que «é apenas uma forma de dizer, para minorar a culpa de quem escreve». Neste caso não houve lapsus linguæ mas mero solecismo bem enraizado já na escrita e na oralidade: «Recuperar câmaras nas autárquicas, dentro de dois anos, é um dos objectivos. O Porto surge como exemplo no topo da lista, onde têm de haver coligações de esquerda, PS, CDU e Bloco juntos» (Noticiário das 10 da noite, Alexandra Madeira, Antena 1, 18.06.2011). Talvez seja um lapsus memoriæ: a repórter esqueceu-se da regra.
Ainda recentemente o escrevi: é aconselhável voltar, de vez em quando, a referir aqui estes erros, que conspurcam toda a comunicação social, como já tivemos oportunidade de apontar mais de uma vez. Até para não dar o sinal, errado, de que tudo está melhor. Pergunto-me o que há de tão complexo para que os jornalistas não percebam o que é a impessoalidade do verbo haver no sentido de existir. Mesmo nos tempos compostos. Mas a democracia é isto: qualquer dia, que não virá longe, as gramáticas vão acolher, como «variante», este erro.
[Texto 178]