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Linguagista

Tradução: «sinon»

Ora essa

 

 

      «Un nombre consideráble de tableaux, sinon tous, etc.», podia ler-se no original, e o tradutor verteu assim: «Um número considerável de quadros, se não todos, etc.» Neste caso, nem sequer basta pensar; não: basta copiar. A conjunção francesa sinon só pode traduzir-se, acho eu, por senão ou excepto. Já mais de uma vez tratámos aqui desta matéria.

 

[Texto 2415]

19 comentários

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    Montexto 13.12.2012 23:39

    SENÃO/SE NÃO – 15 (continuando)


    Por derradeiro, não me esqueça dizer – ou repetir, porque ainda há pouco o disse nos comentos a «Tradução: “now”», 17.01.2012, neste blogue – que a locução «à excepção de» (texto das Ciberdúvidas, ponto 1.2.d) decalca escusadamente o francês; a portuguesa lídima é «com excepção de», assim como em «com ressalva de», etc.


    A locução idiomática francesa é «à l’exception de», não precisam de dizer nem dizem «avec l’exception de»; a locução idiomática portuguesa é «com excepção de», como em «com ressalva de», não devíamos precisar nem dizer «à excepção de». Mas somos Portugueses; logo, tudo ao molho e de preferência em francês.


    E cerremo-nos com mais um senão com cheirinho brasileiro, em versos tão bons que, para modernos, só precisavam de não ter metro nem rima:


    Contenta-te com o teu,


    Não mais peças emprestado;


    Senão, vai dar no que deu:


    Acabas no estourado.

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    Montexto 14.12.2012 06:14

    SENÃO/SE NÃO – 16


    Mas empréstimos e confusões são sinónimos do Lusíada, coitado. Sem cura, para o dizer com o bom Sá.


    Prova: reparai no «senão» desses versos e reparai em que o texto das Ciberdúvidas reconhece, e bem, que no caso do ponto 1.2.a., análogo ao dos versos, é de regra «senão»: «Fala mais alto, senão não te oiço»; ou, como eu pontuaria (mas isto é questão de somenos, e não faltam exemplos de bons autores pontuados como o das Ciberdúvidas): «Fala mais alto; senão, não te oiço.»


    E assim se pode verificar facilmente nos bons textos, e até nos maus. Por exemplo, Garrett, no Arco de Sant’Ana, cap. XXV, que já aqui citei algures:  

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    Montexto 14.12.2012 06:16

    SENÃO/SE NÃO – 17


    «– Bons amigos, e vizinhos, juremos obedecer-lhe em tudo e por tudo.


    – Isso agora muito é – disse uma voz resmungona de entre as turbas. 


    – Em tudo, em tudo! – exclamava a multidão entusiasmada e sem saber o que clamava.


    – Enquanto ele for por nós – continuou o dos escrúpulos: – e tratar de nossa fazenda como cumprir…


    – Está visto: pudera!


    – E senão, não.


    – E senão, não.


    – Alto lá – acudiu Martim Vaz, que viu começar a sacudirem-se pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice popular: – Alto lá!»  

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    Montexto 14.12.2012 06:20

    SENÃO/SE NÃO – 18


    E, para bem se ver e sentir a analogia de «senão» naquele passo de Garrett com «quando não» em conjuntura semelhante, compare-se com estoutro lugar do mesmo estilista e obra, cap. XXI:


    «– Respondei-lhe que sim, que sim, que já se abre a porta, e o sino se tangerá.


    Assim o disse Martim; e Vasco lhe tornou logo:


    – Muito bem; é melhor assim.


    Quando não!... – começaram alguns a rosnar: – ia tudo com seiscentos mil…


    – Silêncio – bradou Vasco.»    


    Pois bem, apesar disto, de evidência apodíctica, um autor como I. Xavier Fernandes escreve o seguinte nas suas Questões de Língua Pátria, vol. II, p. 106: «Escreve-se separadamente, se não, quando o sentido e a análise revelarem duas palavras distintas – pronome ou conjunção, a primeira, e advérbio de negação, a segunda. Exemplos: “quem se não sente, não é filho de boa gente»; “por se não queixar, foi considerado culpado” (casos de pronome e advérbio).»


    E até aqui, muito bem.


    (Com que se sairá o bom Xavier? Vede os próximos capítulos.)

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    Montexto 15.12.2012 19:56


    SENÃO/SE NÃO – 19


    (E mais este passo que se me deparou ainda agora ao folhear as Fábulas de La Fontaine: «Pela aparência não julgueis; / Conselho é velho, mas sábio. / O camponês das margens do Danúbio, / Que Marco Aurélio retratou, bem pode/ Ser prova do que avanço. E senão, vede:» («O Camponês do Danúbio», trad. de Filinto Elísio; Círculo de Leitores, 2000, p. 469)). 


    Mas depois acrescenta Xavier Fernandes tranquilamente: «”se não chover, irei passear”; “estuda, se não, serás reprovado” (casos de conjunção e advérbio).»


    Ora, nunca jamais em bom português se escreveu a segunda frase como o fez o bom Xavier: «estuda, se não, serás reprovado.»


    Isto em português – bom e mau – escreveu-se e escreve-se: «estuda; senão, serás reprovado»; ou, com outra pontuação também admissível: «estuda, senão serás reprovado», como bem escreveu Garrett no passo citado, e como bem se escreveu no exemplo 1.2.a do texto das Ciberdúvidas.  


    Por isso, com esta compreensão da palavrinha já não admiram outros senãos que campeiam nesta obra, em muitas outras questões acertada.    


    Adeus, ó Xavier Fernandes, fica-te embora. Já é tarde tanto para estudares como para seres reprovado. Consola-te: hodie tibi, cras mihi, nem há glótico sem… senão.

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    Montexto 15.12.2012 19:59

    A reboque de SENÃO/SE NÃO – 20: O INFINITIVO


    Nota: O passo de Garrett (Arco, XXV) «Alto lá – acudiu Martim Vaz, que viu começar a sacudirem-se pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice popular», em que só agora reparei, nem se topa outro facilmente, também merece dois minutos de ponderação: «Martim Vaz, que viu começar a sacudirem-se pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice popular».


    Normalmente o que se diz é «começaram a sacudir-se as ressoantes bexigas», como «começaram a erguer-se os braços», e não «começou a erguerem-se os braços», nem «começou a sacudirem-se as bexigas»; e portanto, correspondentemente, «começarem a erguer-se os braços» e «começarem a sacudir-se as bexigas». Com efeito, «começar a sacudirem-se» tem sujeito plural, «as ressoantes bexigas», mas «começar» está no infinitivo impessoal, e «sacudirem-se» no infinitivo pessoal, quando nestes casos a nota do plural se dá logo no primeiro verbo: «começar». «Quando começaram a sacudir-se, quando começaram a erguer-se, quando começaram a queixar-se, depois de começarem a sacudir-se, depois de começarem a erguer-se, depois de começarem a queixar-se», e não: «Quando começou a sacudirem-se, quando começou a erguerem-se, quando começou a queixarem-se, depois de começar a sacudirem-se, depois de começar a erguerem-se, depois de começar a queixarem-se».

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    Montexto 15.12.2012 20:06

    A reboque de SENÃO/SE NÃO – 21: O INFINITIVO


    E todavia Garrett escreveu: «Martim Vaz, que viu começar a sacudirem-se pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice popular».       


    Por quê?


    Por que não: – «Martim Vaz, que viu começarem a sacudir-se pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice»? – E por que não: «Martim Vaz, que viu começar a sacudir-se pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice»? – Ou por que não até só: «Martim Vaz, que viu começar a sacudir pelos ares as ressoantes bexigas da Doidice»?


    É a questão do emprego infinitivo em português, bem mais momentosa do que o «senão», e já tocada em parte na «Lição dos Mestres», em 01.01.2012, neste blogue.


    Acta est fabula, digo eu...


     

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    Montexto 20.12.2012 00:01

    SENÃO/SE NÃO – 22: PARALIPÓMENOS I (arejemos esta palavrinha)


    Alguns exemplos do que se disse no comento 8: «haver que», na acepção de «dever, ter de, ser preciso», se diz em português destes e doutos modos:


    . «Se, como penso, Capitu não disse a verdade, força é reconhecer que não podia dizê-la» (Machado de Assis, o nosso último representante nos trópicos, no dizer do reaccionário minhoto, Dom Casmurro, XLVII).             


      . «Há coisas que só se aprendem tarde; é mister nascer com elas para fazê-las cedo» (no mesmo, XV).


    . «Se eu fosse destemido, é provável que, com a indignação que experimentei, rompesse a chamar-lhe mentiroso, mas então seria preciso confessar-lhe que estivera à escuta, atrás da porta, e uma acção valia a outra» (no mesmo, XXV).


    . «Quanto a mim, por dar mate ao ímpeto glutão,/ Devorei muita carneirada. /Em que é que me ofendera? Nada. /E tive mesmo ocasião/ De comer igualmente o guarda da manada./ Portanto, se é mister sacrificar-me, pronto» (La Fontaine, Fábulas, Círc. de Leitores, 2000, p. 288, «Os Animais Enfermos da Peste», trad. de Machado de Assis).

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    Montexto 20.12.2012 05:31

    SENÃO/SE NÃO – 23: PARALIPÓMENOS II


    Alguns exemplos do que se disse no comento 8: «haver que», na acepção de «dever, ter de, ser preciso», se diz em português destes e doutos modos:


    . «É mister que seja simplesmente, puramente, meramente, política, isto é, que pertença ao domínio público totalmente, unicamente, provativamente, exclusivamente, absolutamente.» Rui Barbosa, O Direito do Amazonas ao Acre Setentrional, I, 156, algures, aqui o lado).


    . «Porque, visto não indicar nome algum, é forçoso pensarmos no Provedor-mor [sic] do governo da cidade de Goa.» Wilhem Stork, Vida e Obras de Camões, trad. de Carolina Michaelis de Vasconcelos, Bonecos Rebeldes (raio de nome!), Lisboa, 2011, p. 384.


      E não: há que reconhecer que não podia dizê-la… há que nascer com elas para fazê-las cedo… haveria que confessar-lhe que estivera à escuta… etc.


    E portanto erra o meu caro Jorge Guimarães Daupiás neste lugar das suas excelentes Novas Recreações Filológicas, Lisboa, 1962/63, p. 144, quando se deixa escrever: «Há que felicitar o autor por esse facto, não de coragem, mas de lógica.» Escrevesse: «É preciso, é necessário, é força, é forçoso, é mister, faz-se mister, cumpre, releva, urge, temos de felicitar, ou ainda melhor, congratular o autor», etc., se queria escrever português lídimo.       

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    Montexto 22.12.2012 19:13

    SENÃO/SE NÃO – 25: PARALIPÓMENOS III

    . Mais um exemplo do que se disse no comento 8:

    «- Silêncio! Eu te direi logo a história toda: é uma prima.

    - Ah! prima. Então não nada que dizer.»

    Garrett, Viagens na Minha Terra, Lello, Vol. I, XXI, p. 169.

    Aqui, haver que está bem empregado porque referido a quantidade, neste caso expressa pela voz nada, que até podia ser omitida, subentendendo-se. Podia pois escrever-se tb correctamente: «Então não há que dizer.» 

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    Montexto 23.12.2012 09:55

    Aliás, 24, e não 25.
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    Montexto 23.12.2012 19:28


              SENÃO/SE NÃO – 25: PARALIPÓMENOS IV

     . Mais um exemplo do que se disse nos comentos 9 a 12: «Quando em 1536 se transferiu definitivamente de Lisboa para Coimbra a Universidade, novo papel glorioso lhe coube, que foi servir de baluarte contra a invasão do Castelhano. Grande número de escritores, senão todos, prosavam e poetavam no idioma do vizinho reino.» Jorge Guimarães Daupiás, Novas Recreações Filológicas, Separata da ‘Revista de Portugal – Série A: – Língua Portuguesa’ – Volumes XXVII/XXVIII – Lisboa, 1962/63, «Coimbra e a Língua Portuguesa», p. 137.

    . Mais um exemplo do que se disse nos comentos de 13 a 19: «O abraço desfez-se, e o beijo terminou enfim, porque os reflexos do Céu na Terra são limitados e imperfeitos como as incompletas existências que a habitam. Senão… invejariam os anjos a vida na da Terra.» Garrett, Viagens na Minha Terra, Lello, vol. I, p. 161-163.     

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    Montexto 24.12.2012 00:40


    SENÃO/SE NÃO – 26: PARALIPÓMENOS V

    . Mais um exemplo do que se disse nos comentos 9 a 12, propriamente o do caso rastreado por Helder:

    «Essa pergunta é feita na tácita suposição de que o requisito de fidelidade concerne apenas a um dos dois idiomas, aquele do qual se traduz. O tradutor, no entanto, é obrigado a fidelidade igual, senão maior, para com o outro idioma, para o qual traduz. Uma versão literal, isto é, fiel a apenas uma das duas línguas, é impossível» (Paulo Rónai, Escola de Tradutores, Edições de Ouro, Rio de Janeiro, 1967, p. 25).

    NB: a apenas uma das línguas: o ouvido – o principal órgão da escrita – de Rónai devia evitar tal encontro: bastava-lhe inverter a ordem: apenas a uma; ou empregar ou somente em vez de apenas: a só uma, a somente uma...   

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    Montexto 24.12.2012 11:11

    SENÃO/SE NÃO – 27: PARALIPÓMENOS VI

    . Mais exemplos do que se disse nos comentos 9 a 12, propriamente o do caso rastreado por Helder (cont.):

    2 – «Como ideal de tradução, o Sr. Mounin com muita graça nos aponta – uma obra original, o Salambô, de Flaubert, “senão completamente traduzido do cartaginês, pelo menos traduzido da história”» (ob. cit., p. 60).

    NB: «o Salambô»: a praxe manda a Salambô, como manda as Farpas, e não o Farpas, etc. Como se devem referir títulos de obras, livros, revistas, etc., ensinou uma e outra vez João de Araújo Correia, cf. Três Meses de Inferno, Nuvens Singulares, etc.

    3 – «A parte mais curiosa da revista [La Parisienne, Abril de 1953, Paris] são, sem dúvida, os exercícios práticos, nos quais, a pedido da redacção, um texto literário francês foi traduzido por uma equipe de escritores, para o castelhano, daí para o italiano, e depois, sucessivamente, para o alemão, o inglês e o chinês, para ser finalmente retraduzida em francês. Devo dizer que o trecho do velho Saint-Simon resistiu bem a tantas vicissitudes e ao sair da última ainda mantém o sentido, senão o estilo» (ob. cit., págs. 63-64).

    Mas Paulo Rónai acrescenta: «É verdade que lhe foi poupado o supremo teste: uma tradução portuguesa pela mão de alguns literatos meus conhecidos.»  

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    Montexto 26.12.2012 14:36

    SENÃO/SE NÃO – 28: PARALIPÓMENOS VII

    . Enfim, ainda quanto aos comentos de 13 a 19, relembremos este passo do homem da Nave que já escarrapachámos aqui a propósito do modo de evitar o escalracho «controlo» e derivados, cf. texto «PPP’s», 24.05.2012: 

    «Entestei o bacamarte ao peito do mais adiantado, que por sinal era o meu tio:

    - Tenha-se, senão morre!

    - Hás-de pagá-las, cão!

    - Tenha-se, tenha-se, senão morre!» (Aquilino Ribeiro, O Malhadinhas, 2007, p. 41).

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    Montexto 26.12.2012 20:58

    SENÃO/SE NÃO – 29: PARALIPÓMENOS VIII

    . Mais ainda quanto aos comentos de 13 a 19: atente-se na exacta respondência e semelhança com o francês: «Il y a aussi, très souvent, dans certaines oeuvres, cet amour “matador-taureau”, ce lien d’entrailles (“Je tue ele taureau ou le taureau me tue”) que le comédien doit éprouver vis-à-vis de son matador ou de sa bête. Sinon, il ne joue qu’au “chique”.»

    Montherlant, España Sagrada, in Coups de Soleil, Gallimard, NRF, 1976, p. 289.

     

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    Montexto 27.12.2012 16:15

    SENÃO/SE NÃO – 30: PARALIPÓMENOS IX

    . Mais ainda quanto aos comentos 9, 12 e 18, sobre a equivalência de «senão» e «quando não»: este vale por «senão», nanja por «se não»: «A nateira escapou-se-me das mãos e foi pura sorte minha eu próprio ter esbarrado com um cidadão que se encontrava no passeio, quando não teria ido parar à valeta.»

    G. P. Wodehouse, O Código dos Woosters, trad. de Ernesto de Carvalho, Aster, p. 22.

    Como quem diz: «A nateira escapou-se-me das mãos e foi pura sorte minha eu próprio ter esbarrado com um cidadão que se encontrava no passeio, senão teria ido parar à valeta.»

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    Montexto 31.12.2012 16:20

    SENÃO/SE NÃO – 31

    Já este é mais um caso de «se não», separados (nem se pode substituir por «quando não):

    «Mas não fugi. Fiquei onde estava, calmo e concentrado. Não sei se cruzei os braços, se não, mas recordo-me de ostentar um vago sorriso de divertimento nos lábios.»

    G. P. Wodehouse, O Código dos Woosters, trad. de Ernesto de Carvalho, Aster, p. 126.

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