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Linguagista

O AOLP90 em 2025

Problema nosso

 

      «Há, de facto, um estranho caminho que vai dos Village People à atual coligação de interesses contraditórios entre oligarcas do tecnofeudalismo, vestidos sombriamente, e tradicionalistas neoreacionários, nascidos das cinzas do Tea Party» («YMCA, de hino gay à masculinidade trumpista», Pedro Adão e Silva, Público, 2.02.2025, p. 32). Nem compreendo como querem seguir as regras do Acordo Ortográfico de 1990, se não o sabem fazer. Não, o problema não é deles, é nosso, que deparamos com isto nos jornais e nos livros.

[Texto 20 861]

O AO90 como ele não é

Há fatos, mas o rei vai nu

 

      «Os maquinistas estão indignados com o Governo e o ministro da Presidência por ligar, de forma “despropositada”, a má classificação de Portugal na segurança ferroviária a nível europeu e a taxa de álcool dos maquinistas. À Renascença, o presidente do sindicato descreve as declarações desta quinta-feira como resultado de uma “perfeita ignorância”, aponta que “um ministro ignorante é um ministro perigoso” e pede a demissão de António Leitão Amaro» («“Um ministro ignorante é perigoso”. Maquinistas indignados por Governo ligar acidentes na ferrovia a álcool», João Pedro Quesado, Rádio Renascença, 14.11.2024, 20h50).

      Assim, de repente, Luís Montenegro já podia substituir pelo menos quatro ministros. É obra. E por ignorância: logo depois, o presidente do Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos-de-Ferro Portugueses (SMAQ) borra a pintura: «“Aquilo que nós assistimos esta tarde, na conferência de imprensa, foi um insulto aos maquinistas. O senhor ministro faz uma relação entre taxas de alcoolemia e sinistros na ferrovia quando não há um nexo causal”, afirma António Domingues» (idem, ibidem). Em português, o verbo assistir no sentido de presenciar ou ver deve ser usado com a preposição a. Portanto, a forma correcta seria esta: «Aquilo a que nós assistimos esta tarde...» Culpa também do jornalista, evidentemente: corrigia. Não contente, ainda anexou a carta enviada ao ministro da Presidência, e eu tive a imprudência de clicar nela para a ampliar. Saltaram-me logo os olhos para isto: «Assim, solicitamos que V. Exa. se retrate publicamente e corrija as suas declarações, esclarecendo a realidade dos fatos e mostrando o devido respeito por todos os profissionais que, diariamente, trabalham para garantir a segurança no transporte ferroviário em Portugal.» Já não quis ler mais. Mas já vou ter pesadelos esta noite.

[Texto 20 521]

Como se aplica o AOLP90

A olhómetro

 

      «Estava uma boa tarde de sol, sentei-me numa esplanada na avenida da Républica para comer um gelado e, na mesa ao lado, dois homens de meia idade, entre os 50 e 60 anos, conversavam com muita desenvoltura» («Polónica: literatura e política», Jacinto Rêgo de Almeida, Jornal de Letras, 16-29.10.2024, p. 35). Por qualquer motivo, que não pode ser bom, os libérrimos intérpretes das regras do Acordo Ortográfico de 1990 procedem a uns cortes aleatórios — assim os vejo — nos hífenes. Entre as principais vítimas encontra-se justamente «meia-idade», seguida logo de «extrema-esquerda» e de «extrema-direita». Um jornal literário não ser revisto é que me parece um contra-senso perigoso. Bem, eles lá sabem. Ou não.

[Texto 20 447]