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Linguagista

Palavras japonesas com origem no português

Fica-lhe muito mal

 

      «O visitante tem acesso imediato a uma das salas de exposição. Nesta primeira sala há um pouco sobre a história que liga Portugal ao Japão. Tem sido muito interessante, porque a maior parte dos japoneses tem uma vaga ideia e sabe que os portugueses estiveram cá há muito tempo, mas não sabe, por exemplo, como aliás em Portugal não sabem, que palavras como pão, botão, copo, álcool, caramelo, são todas palavras portuguesas [afirma, em entrevista, Joana Gomes Cardoso, comissária da representação portuguesa na Expo Osaka]» («“Pão, botão, copo, álcool e caramelo”, as palavras de origem portuguesa que os japoneses usam», Maria João Costa, Rádio Renascença, 13.04.2025, 8h57).

      «Como aliás em Portugal não sabem» — a generalização fica-lhe muito mal, senhora comissária. Há muita gente que sabe que assim é, e eu, pessoalmente, tenho a certeza de que o sei há mais tempo do que a senhora comissária. E também não lhe fica bem o tom paternalista com que parece explicar aos ignorantes portugueses aquilo que, na verdade, muitos já sabem há décadas.

      É mais ou menos do conhecimento geral que diversas palavras do japonês moderno têm origem no português, fruto dos contactos estabelecidos no século XVI entre os navegadores portugueses e o arquipélago nipónico. Entre os exemplos mais conhecidos estão, de facto, pan (パン), que vem de «pão»; botan (ボタン), derivado de «botão»; koppu (コップ), que tem origem em «copo» (embora possa também ter sido reforçado pelo neerlandês); arukōru (アルコール), forma adaptada de «álcool», cuja origem remota é árabe, mas que chegou ao Japão através das línguas europeias, incluindo o português; e karameru (カラメル), do português «caramelo», ainda que esta palavra possa também ter chegado por via do francês ou do inglês. Estas palavras foram integradas no quotidiano japonês a ponto de hoje parecerem nativas, mas são testemunhos claros da influência lexical portuguesa na língua japonesa.

[Texto 21 186]

Etimologia: «écloga»

Começou por ser uma escolha

 

      Sabiam que o termo écloga deriva do grego eklogḗ (ἐκλογή), que significa «escolha» ou «peça escolhida»? Originalmente, referia-se a qualquer composição poética seleccionada, mas, com o tempo, passou a designar especificamente um tipo de poesia pastoril, especialmente com Virgílio e as suas Bucólicas. Desde então, o termo ficou associado a poemas idílicos sobre a vida campestre, muitas vezes em forma de diálogo entre pastores.

[Texto 20 860]

Sobre «em bolandas»

Para terminar

 

      «E apesar da passagem do tempo e das bolanas a que tem sido submetido depois de morto, não nos será difícil, com pequeníssimos ajustes, imaginar diálogo semelhante a este, também assinado por Brandão, aquando da inauguração do monumento a Eça: “— V. Exª leu alguma vez o Eça? — Ler, nunca, mas conheci-o em Évora, delegado do tesouro, e até por causa disso vim ao Príncipe Real ver-lhe um drama de ladrões, que estava mesmo escrito ao meu sabor. — Mas isso não é o Eça de Queiroz, é o Eça Leal. — O quê?! Não é o mesmo? Ai os meus ricos dois contos de réis!”» («A maçã de Newton que acabará por nos cair na cabeça», Ana Cristina Leonardo, «Ípsilon»/Público, 17.01.2025, p. 31).

      Seria, não uma maçã, mas um raio que cairia em cima da cabeça do revisor, acaso o texto tivesse sido revisto. A verdade é que se toda a gente conhece (será?) a locução adverbial e o seu significado, poucos saberão da sua relação com o verbo voar (volar, em castelhano). Em castelhano é en volandas, e o DRAE aponta-lhe dois sentidos: «1. loc. adv. Por el aire o levantado del suelo y como que va volando; 2. loc. adv. coloq. Rápidamente, en un instante.» Ou seja, em castelhano remete directamente para a ideia de elevação, suspensão ou deslocamento rápido, como se estivesse a voar. Em português, a adaptação para «em bolandas» manteve a carga semântica de movimento e instabilidade, mas perdeu a relação óbvia com «voar», tornando-se uma expressão mais idiomática e opaca no uso moderno. Diga-se também que a Porto Editora faz o que eu desaconselho vivamente, que é misturar tudo: «aos tombos; em grande azáfama, atrapalhado». (Não será apenas uma questão de gosto: só se me tivesse caído um caixote de maçãs na cabeça é que eu usaria a locução «aquando de».)

[Texto 20 818]