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Linguagista

Topónimos no AO90

Péssimos exemplos

 

      «E concertos de Verão são coisa que não tem faltado a Luciana Abreu[,] que tem um problema comum a muito boa gente: não gosta de acentos. Vai daí, deu um espectáculo em Pêro Pinheiro, localidade que, sem o devido acento no ‘Pêro’, deixa de ter nome de fruta para passar a parecer-se mais com um galináceo» («Redes sociais são a montra dos pontapés na gramática», Vanessa Fidalgo, «Domingo»/Correio da Manhã, 9.09.2018, p. 20).

      Fruta, galináceo? Primeiro, temos de relembrar que Pêro e Pedro ocorriam indiferentemente, e ambos provinham do latim Petrus. O topónimo tem a mesma origem. Ora, e não é a primeira vez que o afirmo, como outros autores, já na vigência do Acordo Ortográfico de 1945 não fazia sentido manterem-se estes acentos diferenciais. Sim, é certo — mas eram de regra na ortografia oficial. Vamos agora para Luciana Abreu: em que rede social viu Vanessa Fidalgo essa falta de acento? No Facebook, com data de 2 de Julho de 2018, lê-se isto em duas entradas: «Last night in PERÔ PINHEIRO-SINTRA». Mais e mais decisivo: há claramente várias pessoas a escreverem para a página da artista no Facebook, talvez da equipa de comunicação, e ora seguem uma regra ortográfica, ora outra, pelo que, ou condenamos tudo em bloco, ou mais vale estarmos calados.

      Como os nomes das localidades também são alterados com o Acordo Ortográfico de 1990, passámos a ter Armação de Pera, Foz Coa, Azoia, Troia, Pero Pinheiro, etc. Também aqui os génios que negociaram o acordo careceram de uma visão mais alargada: não há praticamente nenhuma diferença entre topónimos e antropónimos, e tanto assim é que temos antropónimos que se tornaram topónimos, e vice-versa. Logo, se, para ressalva de direitos, se veio permitir que cada qual pode manter a grafia do seu nome, o que até foi alargado a quaisquer firmas comerciais, nomes de sociedades, marcas e títulos inscritos em registo público, o mesmo se devia ter previsto para os topónimos nacionais. Assim, o que acontece? Temos metade do País a escrever «Pêro Pinheiro» e a outra metade «Pero Pinheiro». A trapalhada é tão grande, que, era inevitável, se estende aos dicionários. Num texto de apoio da Infopédia — que segue o AO90 —, lê-se «Pêro Pinheiro (Sintra)», mas no corpo do texto é sempre «Pero Pinheiro» que se lê.

 

[Texto 11 235]

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